Dia 8 – Vega de Valcarce a Portomarin
Distância -83Km
Tempo gasto 8h30m

Quando menos esperamos o Caminho prega-nos mais belas surpresas. Foi o caso da fantástica subida e descida ao "Cebreiro" (1390m). Confesso que estava apreensivo pois muita gente me avisou que esta ia ser uma subida díficil ou quase impossível para bicicletas e que devia seguir pela estrada. Encarei a subida como mais uma de entre muitas que não são impossiveis, mas apenas mais morosas de transpor. Levei mais de duas horas a subir o monte, mas achei demasiado simples se bem que compreenda que se tivesse subido na hora de calor intenso iria as coisas seriam muito complicadas! Passei muito tempo a arrastar a bicicleta á mão "monte acima" e mesmo assim passei por muitos peregrinos a pé. A dada altura aproximo-me de um tipo alemão e começamos a falar sobre a dureza da subida e do caminho. Chegámos ambos á conclusão que estava a valer muito a pena percorrer estes 800 kms. O alemão era uma figura jovem,estranha, de 2 metros de altura e muito magro que caminhava a um ritmo muito lento. Disse-me que fazia tudo muito rápido na vida do dia-a-dia mas que encontrara aqui o seu ritmo ideal. Confessou-me que já lhe metia confusão quando o caminho cruzava as cidades maiores e que ao fim da primeira semana decidiu que ia caminhar, dormir e tomar banho ao ar livre sempre que podia. Assim tem feito, vindo de dois em dois dias a um albergue lavar a roupa. Só sei que conversando com ele durante duas horas, quando nos apercebemos tinhamos chegado ao topo de "O Cebreiro". Hoje lembrei-me de uma conversa com o Itabyra de ontém em que ele me dizia que neste caminho andam desde atletas, a pessoas muito debilitadas mentalmente, a pessoas alegres por estarem vivas, pessoas que ficam para sempre a deambular pelo caminho e mesmo pessoas que vem para morrer aqui! Uma coisa é certa nimguém saí daqui da mesma forma que chegou, alguns flipam da cabeça e ficam, mas a grande maioria "faz um reset" e tenta adaptar-se de novo á vida normal. Hoje vi uma pessoa ao longo do caminho com um ar terrível e com aspecto de ter alguma espécie de doença terminal e lembrei-me das palavras do Itabira da noite anterior.
O dia foi um autêntico "sobe e desce" numa zona montanhosa" com muita gente embicicleta de montanha por aqui a fazer pequenos trechos do caminho por diversão. Fui me juntando a alguns grupos, ajudei outros com furos e avarias com o material que transportava nas mochilas para emergências e assim foi passando o dia. Estou agora no Albergue Municipal de Portomarim que fica junto do Rio Lima. Queria continuar mais uns kms mas precisava urgentemente de passar as fotos para CD, pois o cartão de memória estava cheio com tantas fotos que tirei ao longo deste belo dia. Aparentemente só me faltam 92 kms para chegar a Santiago de Compostela e devo chegar amanhã se não houver precalços. Vou ter o dia todo para decidir se termino por ali a minha odisseia ou se sigo mais 100 kms até "ao fim do mundo" em Finistera. Quem faz 800kms também faz (talvez) mais 100 kms. Nunca nas minhas melhores espectativas pensei que poderia fazer o percurso em apenas 9 dias. A ver vamos como me sinto amanhã, pois para já estou "forte como um touro" e sinto-me em grande forma apesar dos dois ou três percursos de maratona diários…

Informação adicional:
Subida ao temível El Cebreiro, o alto de uma montanha com 1390 metros de altitude e cuja subida é interminável e ainda existem muitas outras subidas até chegar a Sarriá (e uma descida incrível também). O desnível acumulado, ou seja, a soma de todas as subidas foi de 1.395 metros de altitude.
El Cebreiro é uma vila muito pequena, que parece saída das histórias de Astérix, o Gaulês, com casas feitas de pedra. Um dos pontos mais emblemáticos do Caminho, o lugar proporcionava assistência aos peregrinos e a sua história data de 1072.
Depois de 20 minutos por lá, resolvi seguir para Sarriá, distante cerca de 48 km. Naturalmente, enfrentei mais subidas, com o sol ainda forte e o vento desestabilizador. Cheguei em Sarriá exausto mas segui até Portomarim onde o vento fortissímo não me deixava avançar mais e resignei-me a ficar por alí. A vontade de chega a Santiago já é grande neste momento!

Até logo!
Paulo Reis